Aposentado por invalidez entra na mira

PREVIDÊNCIA planeja reabilitar trabalhador do setor privado e reduzir gastos que chegam a 18,7% dos benefícios

JULIANNA SOFIA
NATUZA NERY
DE BRASÍLIA
O governo quer reduzir o número de aposentadorias por invalidez pagas pela PREVIDÊNCIA Social e prepara um programa para reabilitar trabalhadores do setor privado.

Com o pagamento desses benefícios, a PREVIDÊNCIA gasta R$ 60 bilhões por ano, atualmente pagos a 3,2 milhões de pessoas. A meta é economizar R$ 25 bilhões com trabalhadores reabilitados.

As estatísticas do Ministério da PREVIDÊNCIA mostram que atualmente 18,7% dos benefícios concedidos são referentes a aposentadorias por invalidez.

Na avaliação do governo, o limite aceitável para esses casos seria de 10%.

"A aposentadoria por invalidez está entre os maiores ralos da PREVIDÊNCIA", disse à Folha o ministro da pasta, Garibaldi Alves.

Um grupo interministerial trabalha na mudança do modelo de reabilitação.

REABILITAÇÃO

O objetivo é criar métodos mais modernos de reavaliação física e profissional dos trabalhadores com base em novas tecnologias. A expectativa é que isso possa ser feito sem alterações na legislação previdenciária.

O Brasil já foi considerado um país de referência internacional na recuperação de trabalhadores e chegou a exportar para a Espanha, na década de 1970, o modelo de reabilitação.

Agora, há o diagnóstico de que é preciso mudar totalmente o programa, que não tem conseguido recuperar os trabalhadores para voltar ao mercado.

De acordo com o Ministério da PREVIDÊNCIA, a atual estrutura brasileira faz com que o trabalhador, ao tentar voltar às atividades profissionais, seja recusado pela empresa em que trabalhava.

Isso ocorre mesmo quando o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) atesta que o segurado está pronto para retomar o trabalho.

O plano que está sendo desenhado envolve, além da PREVIDÊNCIA, os ministérios da Saúde, do Trabalho e do Planejamento.

Técnicos envolvidos na reformulação adiantam que as mudanças podem ser estendidas ao funcionalismo público, que também apresenta elevada taxa de aposentadorias por invalidez.

Para auxiliar no planejamento do novo programa, o governo brasileiro já assinou um acordo com uma instituição alemã especializada no tema.

COMO FUNCIONA

A aposentadoria por invalidez é um benefício concedido aos trabalhadores que, por doença ou acidente, forem considerados incapacitados após perícia médica da PREVIDÊNCIA.

O aposentado por invalidez fica proibido de exercer qualquer outra atividade. Do contrário, perde o benefício.

Ele ainda é obrigado a renovar a avaliação médica a cada dois anos.

Para ter direito, o trabalhador tem que contribuir para a PREVIDÊNCIA Social por um prazo mínimo de um ano em caso de doença. Na hipótese de invalidez por acidente, não há carência.

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Histórico impede ousadia na Previdência, diz ministro

DE BRASÍLIA
Favorável à reforma da PREVIDÊNCIA, o ministro da PREVIDÊNCIA, Garibaldi Alves, afirma que, além das aposentadorias por invalidez, outros ralos drenam recursos públicos em sua pasta.

Ele cita as pensões por morte -para as quais o governo vem afirmando que pretende criar regras mais duras- e a PREVIDÊNCIA do setor rural -deficitária, mas considerada um gasto "justificável" pelo ministro.

Garibaldi defende a fixação de uma idade mínima às pessoas que vierem a entrar no mercado de trabalho, mas ressalva que o governo não tem posição fechada sobre o assunto.

Folha - Há um ambiente mais favorável a uma reforma da PREVIDÊNCIA?

Garibaldi Alves - Desde que eu estou no Congresso há uma reforma da PREVIDÊNCIA em andamento. Começou com Fernando Henrique, depois com Lula. Somente agora é que nós aprovamos a reforma da PREVIDÊNCIA do servidor público, o Funpresp [fundo para complementar aposentadoria dos servidores].

Não é fácil falar que, da noite para o dia, vamos ter uma reforma. Há todo um histórico que não nos permite ser tão ousados. Eu prego a necessidade de uma reforma.

E há necessidade de uma idade mínima?

Sim, há necessidade de ter essa regra [da idade mínima] no Brasil. Olha o que está acontecendo no mundo inteiro, em especial alguns países da Europa.

E o governo apoia?

Há necessidade, mas não posso assegurar que vai ter isso. O ambiente se tornou muito favorável durante a aprovação da reforma da PREVIDÊNCIA do servidor público, mas não há posição fechada.

O que está no Congresso é viável [fim do fator previdenciário]?

Inviável. Isso [fim do fator] quebra a PREVIDÊNCIA. Se for ter, é preciso ter uma proposta do governo. Na Câmara, há uma disposição mesmo de votar, de haver uma discussão sobre o assunto.

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Política previdenciária deve combater origem da invalidez

MARCELO ABI-RAMIA CAETANO
ESPECIAL PARA A FOLHA
A PREVENÇÃO DE DOENÇAS é MAIS BARATA PARA O GOVERNO DO QUE O PAGAMENTO VITALÍCIO DE UMA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ

A aposentadoria por invalidez é um benefício necessário em um sistema de PREVIDÊNCIA que dê segurança aos trabalhadores.

Caso um contribuinte sofra acidente ou tenha uma doença que o incapacite para o exercício de atividades -seja as que já habitualmente realizava ou outras que porventura pudesse fazer-, o INSS pagará uma aposentadoria que lhe garanta renda em um momento muito difícil na vida da sua família.

Como qualquer seguro, é bom tê-lo, mas melhor seria se não houvesse necessidade de usá-lo.

Faço seguro contra incêndio para minha casa, mas fico muito feliz por nunca ter precisado dele e torço para que isso nunca ocorra.

O mesmo acontece com a invalidez. Não há valor que pague o trauma causado pela perda de capacidade do trabalho.

O custo da invalidez tem dimensão econômica bem definida. Para a família, a depender da invalidez, o custo de tratamento é alto e, em alguns casos, um parente deixa de trabalhar para cuidar do doente.

O governo perde a arrecadação dos tributos desse trabalhador e ainda começa a lhe pagar uma pensão. A sociedade passa a ter menos um trabalhador capaz de produzir e gerar riquezas.

Dado esse contexto, é essencial que uma política previdenciária busque tanto minimizar a ocorrência da invalidez quanto reabilitar profissionalmente aqueles que se invalidaram.

O primeiro passo é separar o joio do trigo: o que efetivamente foi invalidez daquilo que decorreu de fraudes ou comportamentos oportunistas em razão de uma legislação frouxa. Para dar credibilidade à política, a punição às fraudes deve ser severa.

Outro ponto é a determinação das causas da invalidez. É certo que acidentes acontecem, mas quanto decorre de falta de treinamento apropriado, de firmas sem incentivos a reduzi-los ou são parte da própria natureza da atividade desenvolvida.

Em relação às doenças, há de identificar como evitá-las. A prevenção é mais barata para o governo do que o pagamento vitalício de uma aposentadoria por invalidez.

Por fim, se não houve meios de impedir a doença ou acidente e a pessoa de fato se invalidou, deve-se buscar a sua reabilitação para que volte a gerar renda por conta própria e não mais dependa de uma transferência governamental.

Os aposentados por invalidez, suas famílias, o governo, os contribuintes e a sociedade como um todo ganham com isso.

MARCELO ABI-RAMIA CAETANO
é economista do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada)

Fonte: Folha de S.Paulo - 22/08/2012