Tesouro dos EUA planeja seus dias de penúria
Se teto da dívida não for elevado, EUA podem suspender pagamentos
Por Damian Paletta e Jon Hilsenrath | The Wall Street Journal
O debate sobre o teto da dívida soberana dos EUA pode forçar o governo americano a considerar medidas drásticas para administrar seus limitados recursos, o que inclui o atraso do pagamento de trilhões de dólares a servidores, beneficiários da PREVIDÊNCIA social, contratos de serviços e outros.
O governo do presidente Barack Obama tem dito que não há Plano B para pagar as contas do governo caso o Congresso se recuse a elevar o limite de US$ 16,4 trilhões da dívida federal. A Casa Branca informou no sábado, por meio de uma nota, que "há apenas duas opções de lidar com o limite da dívida: o Congresso pode pagar suas contas ou optar por não atuar e colocar o país em estado de inadimplência".
O Tesouro pode ser forçado a rever as propostas que analisou durante a crise do limite de endividamento de 2011, a maioria das quais considerou impraticáveis. Elas incluíam a venda de ativos como ouro e títulos lastreados em hipotecas para levantar recursos, cortar todas as despesas em 40% ou priorizar alguns pagamentos em detrimento de outros - por exemplo, pagando os beneficiários da PREVIDÊNCIA Social e não os prestadores de serviços militares.
A proposta considerada mais viável era pagar as contas do governo apenas à medida que a receita fiscal se tornasse disponível, atrasando muitos pagamentos. Há questões importantes que ainda não foram respondidas sobre essa proposta, entre elas, se isso incluiria o atraso do pagamento dos juros sobre a dívida pública.
A crise foi evitada pelo Congresso antes de as autoridades do Tesouro ou o presidente tomarem a decisão final sobre as alternativas, de acordo com relatório do inspetor-geral do Tesouro divulgado no ano passado e entrevistas recentes com pessoas a par da situação.
Autoridades estão atualizando as estimativas de quando o Tesouro ficará sem recursos e podem divulgar as projeções nos próximos dias. Segundo o Bipartisan Policy Center, um centro de estudos de Washington, o Tesouro atingirá esse ponto entre 15 de fevereiro e 1º de março, a menos que o teto da dívida seja elevado.
Uma coisa que a Casa Branca diz que não fará é adotar a extravagante ideia de cunhar US$ 1 trilhão em moedas de platina e depositá-las no Fed, o banco central, como forma de levantar fundos sem realizar empréstimos. O governo diz descartar ainda a possibilidade de tomar empréstimos além do teto, invocando a cláusula da 14ª Emenda Constituicional sobre a dívida pública, que alguns argumentam que permitiria essa prática.
Em carta na sexta-feira enviada ao presidente, o presidente do Senado, Harry Reid, e outros senadores do Partido Democrata encorajaram o presidente Barack Obama a adotar "qualquer medida legal" necessária para continuar pagando as contas do governo. Os EUA deveriam ter atingido o teto da dívida em 31 de dezembro, mas o Tesouro começou a adotar medidas de curto prazo para evitar que o governo se tornasse inadimplente em suas obrigações.
Alguns incentivaram a Casa Branca a divulgar mais detalhes do plano de contingência. O senador republicano Orrin Hatch disse em nota recente que, "dada a ameaça atual de o governo não fazer os pagamentos de que dependem os idosos (...) é razoável que saibamos o seu plano B." O porta-voz do Departamento do Tesouro, Anthony Coley, disse que "não há plano B. O único jeito de proteger as famílias e empresas é o Congresso fazer o seu trabalho."
Na Câmara, a maioria do Partido Republicano diz que não vai elevar o limite da dívida sem que ocorram cortes de gastos em valor equivalente. Obama disse que não vai negociar o assunto, dizendo que a responsabilidade é do Congresso de permitir que o governo pague as contas que assumiu.
O governo gasta 40% a mais do que arrecada e pega dinheiro emprestado para cobrir a diferença. Sem um aumento no teto da dívida, o Tesouro não terá capacidade de obter o dinheiro adicional necessário para pagar suas contas.
Os analistas têm alertado que falhar no pagamentos mesmo de parte das obrigações poderia causar estragos na economia e nos mercados financeiros e possivelmente desencadear outra crise financeira e uma recessão.
Quando as autoridades do Tesouro se viram diante dessa possibilidade, em meados de 2011, tenderam a recomendar a estratégia de atrasar pagamentos do governo, segundo relatório do inspetor geral divulgado em agosto, após um questionamentos de Hatch.
Por essa abordagem, o governo pagaria as contas diariamente só quando tivesse dinheiro suficiente provindo da arrecadação fiscal e de outras receitas. Nos dias em que não tivesse dinheiro, adiaria todos os pagamentos até ter dinheiro suficiente para os pagamentos daquele dia. Então, adiaria pagamentos do dia seguinte até ter o dinheiro necessário e assim por diante.
"Foi a visão organizacional do departamento de que a opção menos prejudicial disponível para o país no momento, entre todas as opções ruins, era implantar um regime de atraso de pagamentos", disse em seu relatório Eric M. Thorson, o inspetor geral do Tesouro.
A ideia de priorizar pagamentos parece ter sido considerada inviável pelas autoridades. O governo realiza 80 milhões de pagamentos por mês. Descobrir qual pagar primeiro seria um pesadelo logístico.
"As autoridades do Tesouro decidiram que não há uma maneira justa ou sensata de selecionar entre as tantas contas que vencem todos os dia", diz o relatório. Uma área pode receber consideração especial. O relatório não respondeu se o regime de atraso de pagamentos incluiria o adiamento do pagamento de juros sobre os títulos do Tesouro. Autoridades do governo não quiseram comentar a questão.
As notas do Tesouro americano são um dos alicerces do sistema financeiro global. Atrasar o pagamento dos juros de um título do Tesouro pode provocar turbulência nos mercados financeiros, causar danos permanentes à classificação de crédito dos EUA, aumentar os custos de financiamento do governo e prejudicar a economia.
É tecnicamente possível priorizar os pagamentos de juros porque eles são feitos por meio de um sistema diferente (conhecido como Fedwire) dos outros milhões de pagamentos diários feitos pelo governo a fornecedores, beneficiários da PREVIDÊNCIA Social e outros.
Ainda assim, um governo que paga juros a detentores de títulos de dívida enquanto atrasa outros pagamentos pode gerar um alvoroço político, preocupação que Obama expressou em 2011. "Vamos mesmo pagar juros para os investidores chineses e deixar pagar a PREVIDÊNCIA das pessoas?", perguntou o presidente à época.
Thorson disse que as autoridades do Tesouro nunca elaboraram uma proposta final em 2011.
Fonte: Valor Econômico - 15/01/2013