Bola da vez
Por Denise Bueno | Para o Valor, de São Paulo
O Brasil é hoje um mercado no qual seguradoras do mundo todo querem estar. Embora a afirmação soe otimista demais para um país que registrou em 2012 um crescimento mais fraco do que as demais economias dos Brics, o interesse pelo setor impressiona. De acordo com a pesquisa "16th Annual Global CEO Survey", realizada pela PriceWaterhouseCoopers, a América Latina permanece sendo a bola da vez. De 92 seguradores entrevistados, em 39 países, 88% afirmaram que o foco da expansão está nos emergentes, com a América Latina no topo da lista.
Maior economia da região, o Brasil recebe boa parte dos investimentos. Em resseguros, já são mais de cem empresas disputando mercado, número relevante considerando-se que até 2007 apenas o IRB Brasil Re era autorizado a operar. No seguro garantia, por exemplo, há cinco anos, três companhias reinavam absolutas. Hoje há perto de 20 concorrentes num nicho no qual até mesmo o governo entrou para ofertar garantias e, com isso, agilizar financiamento para projetos de infraestrutura visando a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos.
O potencial é grande em outros ramos. Apenas 30% da frota nacional de veículos têm seguro, menos de 10% das residências e menos de 5% das pequenas e médias empresas. O seguro rural responde por menos de 10% da área plantada de grãos. "Tenho um sentimento de que em breve teremos uma participação mais significativa do governo no subsídio rural como acontece no México, o que trará um grande desenvolvimento para o agronegócio e para o seguro no Brasil", afirma o ex-ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues.
Segundo executivos do setor, as empresas estrangeiras também valorizam indicadores como o fato de o país ter, para cada cem brasileiros em idade ativa, apenas dez aposentados com mais de 65 anos; metade da população pertencer à classe C; o desemprego abaixo de 6%; a renda per capita superior às da Índia e da China, e a participação do setor de seguros no PIB ser metade dos 8% da média mundial.
Para conhecer melhor esse mercado, o Lloyd"s of London, o mais antigo e importante mercado de seguros do mundo, contratou o ex-presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Meirelles é o segundo estrangeiro a compor o conselho do Lloyd"s.
São dados que despertam o interesse pelo mercado de seguros e colaboram para as projeções de sucesso do IPO da BB Seguridade, que promete ser um dos maiores dos últimos anos, estimado em R$ 12,5 bilhões. Segundo relatórios divulgados por analistas de bancos, a compra de seguros deve crescer muito nos próximos anos com a ascensão das classes C e D. Seguradoras ligadas a bancos, como a BB Seguridade, podem captar clientes sem muito esforço.
Ao contrário do que se poderia imaginar, o IPO da BB Seguros deixou os concorrentes eufóricos. "Por conta do interesse despertado pelo road show realizado pelos bancos emissores do BB, fomos procurados para fazer cerca de 15 apresentações neste início de ano", comenta Samy Hazan, relações com investidores da Porto Seguro, a primeira seguradora a fazer parte do Novo Mercado da bolsa brasileira, em novembro de 2004.
"O BB já vem atuando fortemente no mercado há dois anos e por isso a concorrência já foi sentida. A entrada de mais uma seguradora na bolsa só enaltece o setor de seguros, despertando os analistas para o potencial desse mercado que avançou muito na última década e ainda tem muito para conquistar", afirma Marco Antonio Rossi, presidente da Bradesco Seguros. Em 2012, o grupo lucrou R$ 3,5 bilhões, o que representou 30% do lucro de R$ 11 bilhões do banco. O foco, segundo Rossi, é continuar crescendo de forma orgânica.
Antonio Trindade, diretor do Itaú Unibanco responsável pelos negócios de seguridade do banco, concorda com Rossi. "A concorrência está acirrada há tempos e a meta agora é aumentar a participação na base de clientes do conglomerado, sejam correntistas, portadores de cartões, e nos clientes de nossos parceiros de negócios. Preparamos produtos para todos, do microcrédito ao investidor de grandes projetos, por atuarmos como seguradora multilinha e multicanal", revela.
Enquanto as seguradoras ligadas a bancos se preocupam em conquistar os clientes da casa, as independentes investem em tecnologia e inovação para conquistar corretores e clientes oferecendo agilidade no atendimento, produtos e serviços diferenciados a preços acessíveis. "O IPO do BB é excelente, ao trazer mais liquidez para o setor na bolsa e chamar a atenção dos analistas", afirma Gabriel Portella, que acaba de assumir o comando da SulAmérica Seguros e Previdência, com papéis negociados em bolsa desde outubro de 2007.
As estrangeiras também precisam investir para ser mais conhecidas. A Allianz, maior seguradora da Europa, negocia com a WTorre o "naming rights" da Arena Palestra Itália, estádio do Palmeiras, pelos próximos 20 anos. A ação, se concluída, reforça a estratégia de crescimento e se revela o principal investimento em marca pela Allianz realizado até o momento. Além de reforçar a imagem do grupo, Edward Lange, CEO da Allianz, afirma que "a chave para manter a lucratividade é focar em serviços e valor agregado, com mais apoio aos corretores".
Pablo Barahona, presidente da Liberty no Brasil, conta que o investimento no patrocínio visa gerar reconhecimento para a marca como a Seguradora Oficial da Copa do Mundo da Fifa 2014. Além disso, o objetivo é despertar em seus colaboradores, corretores e segurados o orgulho de fazer parte do importante evento esportivo do mundo. "Não tenho dúvidas de que esta será a maior de todas as Copas do Mundo e que a seguradora será reconhecida por participar dela."
Para Hyung Mo Sung, o IPO do BB aumenta a concorrência e quem sai ganhando é o consumidor brasileiro. "Veja a quantidade de produtos e serviços inovadores que temos lançado", comenta o CEO da Zurich Seguros Gerais, responsável por acompanhar de perto o andamento de quatro obras importantes por ser a seguradora de riscos de engenharia da reforma do Estádio do Maracanã (Rio de Janeiro), da Arena Fonte Nova (Salvador), do Estádio Mané Garrincha (Brasília) e do Itaquerão, em São Paulo. "O diferencial da Zurich no mundo inteiro é ter uma qualificada equipe de engenheiros que ajudam os corretores e clientes a gerenciar riscos", diz.
Já a britânica RSA optou por atuar em nichos, como transportes, frotas, afinidades, risco de engenharia e energia renovável, tema em que é referencia mundial para os fabricantes de equipamentos. "Excelência em gerenciamento de riscos, ferramentas de tecnologia da informação e suporte técnico aos corretores são os elementos que têm nos feito crescer com sustentabilidade no Brasil", afirma Thomas Batt, CEO da RSA Seguros no Brasil.
Outro nicho que desponta com bom potencial é o de microsseguros. O impacto dessas apólices de baixo valor no mercado ainda é incerto, mas calcula-se que o potencial de penetração é de até cem milhões de pessoas dentro de dez anos - 40 milhões até 2016. O cálculo é da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Com essa inclusão, o setor de seguros teria a capacidade de dobrar sua participação no PIB para algo mais próximo da média global.
A expectativa da indústria, com a popularização desses produtos de baixo valor é formar um público consumidor que até hoje não tinha condições financeiras de adquirir seguros - e que, futuramente, pelas projeções, crie o hábito de contratar proteção para a casa, o automóvel, ou um plano de previdência para os filhos. "O microsseguro atenderá às necessidades de proteção prementes das classes mais baixas, especialmente por meio dos produtos do ramo de vida, com inclusão de cobertura de assistência funeral, além de produtos residenciais, de acidentes pessoais e de perda de renda. É uma oportunidade para levar proteção a cem milhões de brasileiros", diz Solange Beatriz Palheiro Mendes, diretora-executiva da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg).
Para Eugênio Velasques, da Bradesco Seguros, os microsseguros representam, depois da bancarização, do acesso ao crédito, da aquisição de automóveis e de itens da linha branca, a derrubada da última fronteira de inclusão para um grande contingente de pessoas. "Nossos testes de venda porta a porta, pelo celular do corretor, foram interessantes. A inadimplência é baixa nessas classes sociais, cerca de 32% inferior na comparação com o mercado tradicional. Tudo o que essa população conquista ela não quer perder", afirma.
Fonte: Valor Econômico - 24/04/2013