Nos EUA, golpes em idosos viram epidemia
26/12/2013 – Valor Econômico
Por E.S. Browning | The Wall Street Journal
O deputado federal americano Joe Atkins visitou uma comunidade de idosos no ano passado e perguntou quantos deles haviam sido alvo de golpistas recentemente.
"Cada um individualmente naquela sala levantou a mão, 75 dos 75", diz Atkins. "Cada um daqueles moradores havia recebido o mesmo telefonema." Quatro disseram a ele que haviam enviado dinheiro e estavam envergonhados.
Tirar vantagem de idosos está se tornando uma epidemia nos Estados Unidos. Pessoas de 60 anos ou mais representaram 26% de todas as queixas de fraude rastreadas pela Comissão Federal de Comércio dos EUA em 2012, a mais alta de todas as faixas etárias. Em 2008, o percentual era de apenas 10%, o menor entre todos os grupos de adultos.
Um em cada cinco americanos com 65 anos ou mais sofreu abusos financeiros, de acordo com uma pesquisa de 2010 feita pela Investor Protection Trust, uma organização de educação financeira. Esses abusos custaram pelo menos US$ 2,9 bilhões aos idosos americanos em 2010, um aumento de 12% em dois anos, de acordo com a Metropolitan Life Insurance Co.
"É um problema grande e crescente", diz Robert Roush, que dirige um centro de educação geriátrica na Faculdade de Medicina Baylor.
A capacidade de reconhecer uma fraude pode diminuir com o envelhecimento, mesmo entre pessoas sem demência, mostra a pesquisa. O aumento do número de idosos também os torna alvos mais atraentes. Além disso, telefonemas baratos via internet, e-mails e a rápida tecnologia de transferência de valores facilitam o contato com potenciais alvos - e a falcatrua. Pessoas que estão passando dificuldades por causa da crise financeira podem estar mais propensas a cair em esquemas de enriquecimento rápido. E os idosos podem acabar perdendo milhares de dólares antes de suas famílias notarem.
Apenas 10% dessas fraudes são registradas, estimam os investigadores. Muitas vezes, os idosos temem perder a independência se seus filhos descobrirem. A maioria dos casos relatados não é sequer investigada.
Vance Callender, chefe de operações da Agência de Fiscalização Aduaneira e de Imigração dos EUA, contabilizou uma vez os casos de fraude realizados do exterior. "Coletamos 36 mil vítimas" em seis meses, em 2009, "e não podemos abrir 36 mil investigações", diz ele.
"Não é segredo que devemos priorizar os nossos casos", diz o agente especial de fiscalização David Nanz, que supervisiona as investigações de fraude corporativa e de investimentos em valores mobiliários do Federal Bureau of Investigation (FBI), no escritório de Miami.
Fraudes financeiras são caras para investigar. Pode existir pouca evidência concreta e os supostos golpistas afirmam que o dinheiro foi dado a eles por vontade própria ou que as perdas eram legítimas.
Algumas autoridades desistiram de investigações individuais e estão tentando construir bases de dados de redes criminosas ou simplesmente educar os idosos. É uma batalha difícil e os governos têm pouco dinheiro para financiá-la.
Delores Aird, de 85 anos, foi vítima de uma fraude praticada da Jamaica, que a levou à falência ao convencê-la de que havia ganho US$ 2,5 milhões e um Mercedes-Benz na loteria em 2010.
Antes de sua família assumir o controle de suas finanças e mudar seu número de telefone, Aird enviou US$ 47 mil para tentar coletar "os ganhos". Ela tentou hipotecar sua casa. Quando seu filho a abordou a respeito, ela estava tremendo de ansiedade na varanda, com o telefone na mão.
"Eles te pegam de tal jeito que você nem sabe seu nome, você fica tão confusa", diz ela.
Às vezes os fraudadores telefonam uma dúzia de vezes por dia, forjando relações pessoais com vítimas solitárias. Eles conversam sobre as opções de cor para o carro ou o que fazer com o dinheiro ganho. Eles vão anunciando pequenas "taxas" que crescem com o tempo conforme "problemas" vão surgindo. As vítimas ficam cada vez mais ansiosas para coletar seus ganhos. Quanto mais dinheiro enviam, mais difícil se torna para que abandonem a história.
Quando o filho de Aird atendeu ao telefone, um fraudador ameaçou matá-lo se ele interferisse, diz o filho. Os fraudadores fingem ser transportadores de automóveis, advogados, funcionários de bancos e até agentes do FBI e delegados, todos precisando de dinheiro para resolver problemas. Aird diz que deve ter fornecido informações pessoais, porque eles parecem ter renovado cartões de crédito vencidos, que ela então usou para enviar mais dinheiro.
Mais de um terço das pessoas com mais de 71 anos sofre de algum tipo de enfraquecimento cognitivo, segundo estudo da Universidade Duke. Esse enfraquecimento leve é difícil de ser detectado, afirma Robert Roush, que é doutor em educação. "Você pode jogar golfe, ir a restaurantes, assistir à ópera. Você pode fazer quase tudo o que está acostumado com exceção de gerir o seu dinheiro com segurança", diz ele.
Um médico avaliou Aird e disse que ela não sofre de demência, segundo ela e sua filha, mas ainda assim ela não conseguiu resistir ao golpe.
As autoridades federais muitas vezes se recusam a investigar casos que envolvam menos de US$ 100 mil. Um detetive da polícia de Minnesota analisou o caso de Aird, mas não foi capaz de recuperar nada.
Este ano, a lei jamaicana começou a considerar esse tipo de fraude um crime. "O golpe é altamente organizado", diz a inspetora Dahlia Garrick, porta-voz da Força-Tarefa de Combate à Corrupção e aos Maiores Crimes Organizados da Jamaica. "Estamos ativamente perseguindo infratores com base nessa lei."
Existem outros tipos de golpes que visam os idosos. Aumentaram, por exemplo, as fraudes contra idosos que usam sites de namoro. Namorados virtuais tiram dinheiro de suas vítimas para financiar supostas visitas ou emergências.
Outro alvo são as pessoas que trabalham em casa e não têm dinheiro para aposentadoria. Golpistas convencem suas vítimas a pagar por treinamentos on-line caros e ineficazes e pela criação de websites.
O golpe do vovô, que também é praticado no Brasil e foi aplicado nos idosos visitados pelo deputado Atkins, consiste no telefonema de um golpista fingindo ser um neto.
"É você, Billy?", o avô responde.
"Sim!", diz o golpista. "É o Billy. Fui sequestrado no México. Envia US$ 2 mil ou eles vão me machucar! Não diga nada para os meus pais."
Um número surpreendente de pessoas envia dinheiro.
Golpes que oferecem dicas de ações e investimentos falsos continuam generalizados.
"Todo mundo quer participar porque eles veem as pessoas ganhando 7% ou 8% [com investimentos mais arriscados] e o dinheiro deles está parado no banco recebendo 1% ou 2%", diz Eric Bustillo, que dirige o escritório regional da Securities and Exchange Commission, a CVM americana, em Miami.