Previdência (III): requisito de capital
08/10/2014 – Valor Econômico
Por Fabio Giambiagi
Este é o terceiro de uma série de oito artigos que tenho programado neste espaço abordando temas da Previdência Complementar. Nos dois primeiros, expliquei a necessidade de contribuição associada a uma renda desejada no futuro e no segundo como diferentes níveis de contribuição com diferentes combinações de duração e de taxa de juros geram uma matriz de resultados da renda complementar futura. Hoje vamos tratar do requerimento de capital associado a uma aposentadoria futura.
O propósito desta série de oito artigos é duplo. Por um lado, gostaria de compartilhar um pouco do que aprendi lidando com estes temas, no intuito pedagógico de alertar acerca da importância de ter uma atitude previdente desde o início da vida ativa. Por outro, quero chamar a atenção para a importância decisiva da taxa de juros nos cálculos desse tipo, o que se relaciona com os ajustes que o país ainda terá que passar se almejar ter juros baixos por décadas a fio, depois da alta recente, que todos torcemos que seja apenas temporária.
Sempre fiquei impressionado com a frequência com que fico sabendo de casos de indivíduos que não se prepararam adequadamente em termos financeiros para a chegada da maturidade - e padecem de sérias dificuldades econômicas por conta dessa falha. Isso abrange desde o pequeno comerciante que contribuía para o INSS apenas sobre o salário mínimo e levava para casa R$ 4 mil ou R$ 5 mil por mês, não tendo mais disposição para "tocar" a loja na velhice e ficando limitado a uma aposentadoria hoje de R$ 724, até o ex-diretor de banco com remuneração de muitos zeros à direita que não montou nenhum esquema especial de aposentadoria, confiando em se sustentar com o patrimônio acumulado, dramaticamente reduzido após alguns investimentos mal sucedidos no mercado de ações.
No meio, há todo tipo de profissionais liberais que só pelos 40 anos começam a pensar em como fazer para complementar a aposentadoria do INSS. Sempre achei que é um crime que nossas escolas, nas últimas décadas sempre preocupadas em ensinar a nossos filhos matérias com baixa qualidade acadêmica - e algumas de utilidade duvidosa - não preparem o adolescente financeiramente para a vida adulta, tratando das questões que estamos abordando nestes artigos.
O exemplo padrão aqui considerado se baseia na "Annuity 2000 basic table", ou, no jargão atuarial, "AT-2000" (tábua de mortalidade utilizada em geral pelos fundos de pensão na elaboração das suas projeções). Considere-se um jovem do sexo masculino que estuda até os 18 anos e posteriormente faz 4 anos de faculdade, começando a trabalhar aos 22 anos. Quando se aposentar com 57 anos, após 35 anos de contribuição, a expectativa de vida da pessoa será de viver aproximadamente até os 83 anos, ou seja, mais 26 anos.
Nesses cálculos financeiros, porém, quando se considera a existência de uma pensão, o que importa é a expectativa de duração do benefício e, nesse caso, o relevante é a expectativa de vida da esposa, que em muitos dos cálculos utilizados supõe-se que estatisticamente seja 3 anos menor que o homem e que na idade em que este se aposenta tem uma expectativa de vida que vai até os 86 anos. Se o homem vive até os 83 anos, quando ele falece a esposa tem 80 e ela vive até os 86, isso significa que o benefício se estende por 26 + 6 = 32 anos.
No exercício, considerou-se a duração do benefício por 32 anos e, para fins comparativos, com certa dose de arbitrariedade, adotou-se uma hipótese alternativa de 5 anos a menos, ou seja, de 27 anos. Os resultados estão na tabela, para uma aposentadoria complementar de R$ 1.000/mês. Se a taxa de juros é nula, o cálculo do requisito de capital para sustentar o benefício durante 32 anos é muito simples: 32 x 12 meses x R$ 1.000 = R$ 384.000. Já com uma taxa de juros real de 6 % a.a., basta acumular R$ 174 mil, pois os rendimentos do capital acumulado farão o resto.
Observe o leitor, porém, que se a taxa de juros cai de 6 % para 4 %, a necessidade de poupança prévia no momento da aposentadoria sofre um acréscimo de 26 %. Para facilitar as contas, estamos supondo autopatrocínio e passando por cima de taxas de administração e do chamado "risco de sobrevida" que, num cálculo mais sofisticado, teriam que ser considerados na conta.
Há dois números que se deseja destacar aqui: 1- quem quiser ter uma renda complementar de R$ 10.000/mês além do INSS, no caso básico, terá que acumular R$ 1,736 milhão se a taxa de juros for de 6 %; e 2- esse requisito aumentará para R$ 2,184 milhões com uma taxa de juros de 4 %. Para quem é jovem, o conselho é: poupe desde agora! E, se os juros caírem, poupe mais ainda!
Fabio Giambiagi, economista, coorganizador do livro "Economia Brasileira Contemporânea: 1945/2010" (Editora Campus), escreve mensalmente às quartas-feiras. E-mail: fgiambia@terra.com.br.