Aprender com erros e acertos dos outros
05/11/2014 – Valor Econômico
Por Alexandre Frade
Após dez anos dedicados ao dia a dia de fundos de pensão, tenho a possibilidade agora de observar de fora, por novas lentes, um dos momentos mais importantes do ano para o segmento de previdência complementar, em que profissionais das mais diversas formações, com pontos de vista por vezes opostos, se unem com o objetivo de encontrar os caminhos que cada entidade irá trilhar nos exercícios que se avizinham. O primeiro ano de trabalho na BlackRock e o contato com diversos clientes do segmento contribuíram para que eu percebesse que, apesar de características muito próprias de cada fundo de pensão, boa parte dos desafios é comum, assim como as discussões e o processo de tomada de decisão. Com esses desafios em mente, gostaria de propor uma discussão sobre o tema de investimentos no exterior e os benefícios que uma alocação internacional podem trazer em termos de diversificação de carteiras.
Todos os anos, geralmente ao longo do segundo semestre, gestores, consultores, atuários, analistas de riscos, representantes de patrocinadoras e patrocinados sentam-se para discutir os resultados obtidos, a evolução dos passivos, a volatilidade do resultado das carteiras e o cenário macroeconômico, unidos na desafiadora tarefa de debater o ALM [sigla em inglês para asset liability management, que é o estudo para o casamento de ativos e passivos futuros] e aprovar uma política de investimentos para endereçar os anseios de cada grupo representado e possibilitar, para os mais diversos cenários e modelos testados, as taxas de retorno necessárias para fazer face ao passivo atuarial.
A decisão de aumentar ou reduzir o apetite a risco das alocações, incluir ou não novas classes de investimentos e rever planos alterados por circunstâncias novas nunca perde de vista a natureza conservadora de promover estabilidade aos cotistas dos planos, que contam com o retorno destes investimentos para gozar de seus benefícios após o fim dos seus ciclos profissionais.
Os cenários em que todas estas discussões acontecem são por vezes muito desafiadores. Diferentes visões sobre inflação, ciclo de taxas de juros, câmbio e tantos outros fatores que afetam o resultado dos investimentos testam a convicção dos alocadores de recursos, que não só precisam encontrar pontos de referência seguros no horizonte, para não permitir que perturbações de curto prazo afetem o curso traçado com a participação de todos, mas precisam construir um consenso em torno de novas propostas e aprová-la junto a uma governança diversa, para a qual conceitos de economia e teoria de finanças nem sempre estão na ponta da língua, mas exigem uma introdução mais detalhada. Consenso difícil, mas extremamente necessário.
Muitos temas tiveram destaque nos últimos anos, mas um em especial: o monitoramento e controle dos riscos das carteiras. Outrora preocupação de um público reduzido, formado por profissionais de ciências exatas, essa discussão veio para o centro do palco, gerando debates entre legisladores, formadores de opinião e toda a cadeia de gestão de recursos. A crise de 2008, que evidenciou a todos a enorme influência do cenário externo na economia local, virou de cabeça para baixo a realidade outrora confortável, de títulos de baixo risco e alta liquidez com rentabilidade acima da meta atuarial. A noção de que um portfólio com foco local fosse sempre oferecer um porto seguro para os investimentos foi então desfeita. Discussões já comuns em mercados mais maduros, sobre diversificação de fatores de risco, separação entre alfa e beta, liquidez, investimentos alternativos, hedge, marcação a mercado e crédito privado passaram a fazer parte do dia a dia dos fundos de pensão locais.
Nesse contexto, políticas de investimento com horizonte de avaliação mais longo, que não coloquem em conflito a necessidade de investimentos de longo prazo e a prestação de contas em exercícios fechados de um ano, discussões sobre como implementar estratégias antes pouco utilizadas, como proteção de posições e procura de ativos com baixas correlações, ganharam espaço, e é provável que patamares predefinidos para proteção de carteiras e alocações em ativos no exterior, antes considerados discussões com prazo para maturação mais longos, ganhem espaço nos debates.
É fato que produtos que permitam tanto uma exposição de longo prazo quanto a possibilidade de entrada e saída com agilidade de posições auxiliam os fundos de pensão na diversificação de risco das carteiras e no acesso a esta nova fronteira de investimentos. O mercado brasileiro hoje já oferece algumas alternativas neste sentido.
Durante o ciclo de contribuição de um participante, por volta de 35 anos, existe uma possibilidade enorme de que os ciclos econômicos atravessem os seus mais variados estágios, com mais ou menos crescimento, inflação mais alta e mais baixa, choques externos, mudanças na legislação, além de inúmeros outros desafios que quem trabalha no segmento certamente não terá dificuldade em listar. A mudança parece ser a única variável conhecida nesta equação.
As discussões se sofisticam, e o relacionamento com gestores que já possuem histórico e produtos alinhados às novas necessidades tem importância estratégica na tradução das ideias para o campo prático. Olhar para a experiência de outros países, entender como outros clientes trataram situações similares e aprender com acertos e erros já cometidos são atitudes que podem ganhar tempo neste acúmulo de conhecimento, e fazer a diferença na rentabilidade dos planos. Neste contexto, a procura por especialização deixa de ser um luxo e configura necessidade premente.
Alexandre Frade é vice-presidente da BlackRock Brasil e gestor de portfólios responsável por ETFs e fundos de investimento tradicionais (CVM 409).
E-mail: atendimentoclientesbrasil@blackrock.com
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