Estratégia da barata aumenta chances de sobrevivência nos mercados em ebulição
06/11/2014 – Valor Econômico
Por James Saft | Da Reuters, de Nova York
Todo mundo quer ser uma águia nos investimentos e a maioria falha, mas o importante a ser lembrado é: todo mundo pode ser uma barata. A história dos investimentos nos últimos 25 anos envolve muito a adoção de uma abordagem cada vez mais complexa e oportunista, com muita ênfase em posições de pouca liquidez e transparência.
Isso é melhor exemplificado entre os grandes investidores que visam o longo prazo, pela adaptação disseminada do Endowment Model (Modelo Dotação), às vezes chamado de Modelo Yale, que teve como precursor de grande sucesso David Swensen. Sob esse modelo, a dívida tradicional e o mix de ações são parcialmente evitados, em favor de concentrações maiores em private equity, fundos de hedge, commodities e às vezes terras.
A gestão de risco, sob essa ótica, compete a modelos quantitativos das características esperadas do portfólio. Essa estratégia, em resumo, é inteligente demais para seu próprio benefício, afirma Bob Maynard, diretor de investimentos do Sistema Público de Aposentadoria de Idaho, que gerencia US$ 14,7 bilhões. Como a dificuldade de gerenciamento de risco aumenta à medida que as carteiras e seus investimentos ficam mais complexos, uma abordagem mais simples pode oferecer uma maior estabilidade.
"A barata vive em um ambiente altamente complexo, com um das melhores taxas de sucesso de longo prazo entre todas as criaturas. Mesmo assim, ela possui apenas um mecanismo de defesa - correr no sentido contrário do deslocamento de ar", escreve Maynard em um novo "paper" sobre a gestão de risco.
"O equivalente no mundo dos investimentos é uma estrutura muito simples fundada sob a diversificação do mercado público com um mecanismo de defesa básico: perceber um movimento volátil, reagir na direção oposta (ou seja, rebalancear para ela). Ao se aderir a uma estrutura e uma estratégia simples, tem-se uma das melhores chances de sobrevivência por muitas décadas."
Maynard escreveu, no caso, como membro do 300 Club, um grupo global de profissionais de investimentos preocupados com as mudanças de longo prazo ocorridas no setor, em direção a modelos e produtos mais caros e mais complexos.
Embora as baratas, ao contrário dos gestores de fundos de hedge e private equity, não construam mansões em Greenwich, elas o fazem como forma de sobrevivência da espécie. E mais: a abordagem da barata na gestão de portfólios não depende de identificar a genialidade e rezar para que ela nunca falhe. Em vez disso, o portfólio do inseto, com a distribuição tradicional entre ações e títulos de dívida e uma dedicação tenaz ao rebalanceamento, não importam as condições do tempo, pode fazer tudo certo a um baixo custo. Ou melhor, pode fazer tudo certo em parte por causa dos custos baixos.
Nos bons e velhos tempos (pense nos início da década de 90 e antes disso), a gestão de riscos para fundos de pensão e de doações era relativamente mais fácil, em grande parte porque quase todas as posições eram títulos transparentes que tinham seus preços estabelecidos constantemente e, o que é mais importante, independentemente. Isso significa que quando ocorria uma onda de vendas, ou quando uma bolha era formada, os gestores podiam ver o que estava acontecendo fácil e rapidamente. A resposta, e isso não é ficção científica, é simplesmente rebalancear, comprar ou vender aquilo que mudou de valor para manter as proporções dentro da meta.
Por outro lado, gerenciar o risco quando se tem áreas florestais ou parcerias limitadas de private equity é bem mais complexo. Os preços não só não são independentes como também não são contínuos, e os esforços para controlar esses riscos idiossincráticos dependem mais da matemática e de suposições.
Maynard afirma que, em vez de partir para o cara ou coroa, ou para a distribuição linear, os mercados ficam altamente voláteis no curto prazo, comportando-se mais como gráficos de um sismógrafo, incluindo os terremotos, do que como uma distribuição aleatória "normal" dos movimentos.
A boa notícia é que isso é suavizado em períodos mais longos, mas a má notícia para os fundos de doações é que as ferramentas que eles têm não são adequadas à tarefa de gerenciamento de risco que eles têm à mão.
"Durante a crise financeira, a natureza diferente dos mercados no curto prazo acabou oferecendo apenas oportunidades para perdas, e não para ganhos, para o Endowment Model, porque ele não é transparente, fiando-se, em vez disso, nos sistemas e modelos quantitativos de controle de risco", escreve Maynard.
Sejam elas o "value-at-risk", com suas suposições ingênuas baseadas na sorte, ou análises de regressão, com sua dependência das relações lineares, todas essas ferramentas inevitavelmente falham quando os mercados entram em erupção - o que inevitavelmente acontece.
Pense na coisa da seguinte maneira: gerenciar com base nas ferramentas de administração de riscos é como voar em um avião por instrumentos. Mas o voo por instrumentos é determinado no fato de que as montanhas não se mexem, nem decolam. Conduzir um portfólio via "voo por instrumentos", que é o que se é forçado a fazer quando se está abarrotado de produtos complexos, pouco transparentes (e caros), é extremamente perigoso.
Melhor então, nos investimentos, reduzir a altitude, se isso for necessário, para que se possa voar no manual e reagir às montanhas em movimento dos mercados financeiros.
Baratas não pilotam aviões por instrumentos a 12.000 metros de altura, mas também não caem com eles. (Tradução de Mario Zamarian)
James Saft é colunista da Reuters. Este artigo expressa as visões do autor, e não as opiniões do jornal Valor Econômico.